O elitismo classista e o transporte público no Brasil
O transporte é uma atividade meio e, para exercer sua função, é necessário que esteja disponível com equidade para todas as classes sociais.
É preciso discutir um redesenho técnico para superar a crise do transporte coletivo nas grandes cidades brasileiras.
21 de fevereiro de 2022O transporte coletivo nas grandes cidades brasileiras já estava em crise antes da pandemia, com a demanda de passageiros caindo há anos. Alternativas de financiamento do sistema entraram em discussão, mas pouco se fala sobre seu redesenho técnico. Em Porto Alegre, o pacote apresentado pela gestão Melo, de revisão das gratuidades e eliminação gradual dos cobradores, é tímido. A passagem ainda corre risco de subir para R$6.
O que se pode fazer? Automóveis privados, que ocupam quase todo espaço viário, embora correspondam por apenas um terço dos deslocamentos, devem ter demanda controlada, seja criando mais faixas de ônibus ou pedágio urbano para carros. Um início seria eliminar as vagas de estacionamento ao longo das vias, uso ineficiente de espaço público em benefício privado dos motoristas. A rede cicloviária deve ser expandida e integrada aos terminais e paradas, facilitando o acesso ao ônibus. Vans e microônibus devem ser legalizados e regulados, provendo rotas mais diretas e cobrindo áreas periféricas com maior eficiência, complementando o transporte de massa, que seria mantido em corredores de maior fluxo.
Dados sobre padrões de deslocamento e lotação das rotas atuais devem ser coletados e monitorados. Para evitar ônibus ora muito cheios ou vazios, deve ser realizado ajuste periódico do desenho das rotas assim como reduções de tarifa em horários fora de pico. Operadores concessionários precisam de metas operacionais claras, se possível em licitação separando fornecimento de veículos da operação do sistema, aumentando o número de possíveis concorrentes. As sugestões acima não requerem investimentos significativos, mas sim revisões regulatórias e operacionais.
Mesmo assim, sendo subsídios necessários, é preciso considerar o apoio direto aos passageiros de baixa renda que mais precisam, e não aos operadores. Se a ineficiência é recompensada, os incentivos operacionais nunca estarão alinhados: a cidade de São Paulo subsidia operadores de transporte anualmente com cerca de R$3 bilhões, sem perspectiva de melhoria na qualidade do serviço. Porto Alegre não deveria seguir o mesmo caminho.
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Artigo publicado no jornal Zero Hora em 15 de fevereiro de 2022.
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